Esses dias conversava e ouvia afetuosamente as histórias e estórias do meu velho pai, que hoje no auge dos seus 83 anos de idade, cabelinhos brancos, mãos fortes e marcadas por toda a sua trajetória de vida, gosta de recordar e compartilhar sua vida pessoal e profissional. São fatos narrados de forma oscilante entre alegrias, tristezas, empolgação, emoção e repletos de ensinamentos, aprendizados e sabedoria.
Contava ele, que em sua época não aproveitou a sua infância como deveria ser, pois na faixa etária entre 8 e 10 anos de idade, já iniciou sua vida profissional, comercializando cocadas, tapiocas feitas pela sua mãe e vez por outra acompanhando o pai nos barcos de pesca, tudo isso, para contribuir com a pequena força de trabalho para o sustento da família, até completar a maior idade, chegando a desvincular-se da família para servir às forças armadas, em seguida foi ser servidor público de uma instituição financeira e de lá só desvinculou-se com a chegada do período de aposentadoria.
Durante nossa prosa e na companhia de um delicioso cafezinho bem quentinho e saborosos biscoitinhos amanteigados de amido, tornava ainda mais especial o momento. Ele criticou o modelo atual utilizado por alguns jovens e validado pelas famílias, referindo-se aos jovens que resolvem graduar-se, especializar-se, fazer mestrado, inglês e só depois de inúmeros certificados é que considera pronto para o mercado de trabalho. Grande engano, disse ele. Pois quando chega no mercado de trabalho, no mundo corporativo e vai encarar a prática não funciona e faz-se necessário aprender a reaprender um novo aprendizado, procurando adaptar os saberes.
Logo que meu pai concluiu o relato, fiquei reflexiva, concordei veemente e lembrei de uma experiência própria que ia muito ao encontro do que havia externado.
Em um período da minha vida, passei em um processo seletivo para gerente trainee de uma grande rede de varejo do nosso país. A seletiva foi de quatro dias, cento e vinte candidatos para a ocupação de quatro vagas. Durante os dois primeiros dias, não me saí muito bem no processo, mas no último dia foi nos colocado uma dinâmica em grupo que nos desafiava em um curto intervalo de tempo cumprir com o objetivo. Vale lembrar que deveria ter a participação de todos e foi justamente nessa parte da seletiva, que me sobressaí com a habilidade do trabalho em equipe, persuasão, liderança participativa e compartilhamento de ensinamentos e o objetivo foi cumprido, apesar de comprido.
Após alguns dias, recebi uma devolutiva do processo seletivo comunicando a minha aprovação e que dentro de algumas semanas eu ingressaria em um curso presencial de cento e vinte dias, para formação de Gerente de Loja, sendo necessária à minha transferência de cidade para participação no respectivo curso.
Foram cento e vinte dias muito intensos com aulas teóricas de segunda a sábado, estudos constantes durante o fim de semana e no horário noturno, para aprovação nas provas que eram aplicadas no decorrer da semana. O curso não validaria completamente a minha aprovação no processo seletivo, pois poderia acontecer durante a formação que a empresa ou o candidato não se identificasse com a função, trabalho ou cultura da empresa, podendo acontecer tudo, mas também poderia não acontecer nada.
Concluído o curso, eu estava pronta para assumir o cargo de Gerente de Loja, liderando uma equipe de vinte funcionários aproximadamente.
Regressei ao meu logradouro e assumi a gerência da loja. Um dos primeiros desafios foi substituir o gestor anterior, o qual era amado e muito estimado pela equipe, mas por falta de resultado quantitativo foi desvinculado pela empresa. E ao assumir parece que tudo que aprendi durante três meses estava em sentido contrário. Como assim? No curso não ensinaram e nem tinha cartilha com o passo a passo, como os funcionários devem gostar da liderança, ter empatia. Em resumo: a equipe GOSTA ou DESGOSTA. Foi quando lembrei muito dos ensinamentos do meu pai com a sua sabedoria de quem muito já aprendeu com a Universidade da VIDA.
E fui vivenciando como gestora cada desafio, muitas vezes me sentindo totalmente vitimada, perdida, vontade de desistir, chorei muito no banheiro da loja, no caminho para casa, era um sentimento de frustração, de quem estudou, mas não estava conseguindo colocar os ensinamentos em prática. Eram exemplos como: estoque que não batia, insatisfação de clientes com o atendimento dos funcionários, falta de produto, loja suja, um verdadeiro CAOS.
Foi quando em meios a todo CAOS, parei tudo e disse: eu estou totalmente errada, não aprendi nada, liderar pessoas não se aprende com teoria. Solicitei afastamento por um mês do cargo de gerente e fui aprender a ser mais gente, gente que sente. Fui entender e aprender todo o processo de limpeza da loja com o auxiliar de serviços gerais e durante as aulas que recebi dele, observei que poderíamos melhorar, se juntos soubéssemos tecnicamente a parte de diluição de produtos, produtos adequados para o piso da loja, pois o que era utilizado não era apropriado.
Em continuidade as minhas aulas práticas na loja, fui ser operadora de caixa e na função aprendi com os demais operadores de caixa, que a loja tinha um público diferenciado, que compravam mais em dinheiro e em cartão de crédito, em vez do carão de debito e em virtude do manuseio com dinheiro, a quantidade de troco não era suficiente para o trabalho de turno, sendo necessário um montante maior de dinheiro trocado para operacionalização do trabalho e junto com os demais operadores de caixa, procuramos estimular nossos clientes a utilizarem o cartão de debito, pois era mais seguro e rápido na operacionalização. Nessa mesma função observei que não era questionado pelo operador de caixa ao cliente se havia faltado algum produto na loja, objetivando o lançamento no zero balcão (zero balcão é um tipo de formulário que preenchemos a cada produto que o cliente não encontra na loja e no fim do dia lançamos no sistema online e o setor comercial e logística da empresa passa analisar a viabilidade do produto na loja). E para concluir o meu aprendizado na prática, foi chegado a vez de ser vendedora da loja, fui sentir as necessidades desse profissional, que encontravam-se em uma tremenda zona de conforto, dificultando alavancagem de vendas, porém, em alguns casos essa zona de conforto se dava por falta de estímulo e de desconhecimento de algumas ações que poderiam ser realizadas.
Bom...depois de me colocar literalmente no lugar do outro, ainda faltava passar por uma prova de nervos e demasiadamente desafiadora, temerosa por todos os funcionários da loja, que era vivenciar um assalto e como tudo comigo precisa ser intenso, em um único dia experienciei dois assaltos na loja. Ufa!! Fortes Emoções.
Agora sim, eu poderia dizer que estava apta a ser gerente de loja. Com todas essas experiências vividas, parti para o plano de ação focado em educação dentro da loja, reuniões com plano de ações, feedbacks constantes, campanhas de incentivos, diálogos transparentes e celebração de resultados. Nos tornamos uma equipe unida, participativa, criativa e feliz.
A maior lição que aprendi foi que: SÓ SE COBRA O QUE SE ENSINA, SÓ ENSINA O QUE SE APRENDE. E muitos aprendizados não se adquire com a formação acadêmica, mas com a prática da universidade da vida.
Este post foi criado por:
Rosana Nicácio - Consultora Especialista em Recursos Humanos e Mentora em Desenvolvimento Pessoal e Profissional
Blog: www.rosananicacio.com.br
Instagram: @rosana.nicacio
Só se cobra o que se ensina, só ensina o que se aprende
Reviewed by Jonas Schell
on
março 31, 2019
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